Al Berto

ciclo do mês - abril 2018

 

 

 

 

AL BERTO é uma longametragem sobre o regresso do poeta Al Berto a Portugal após a sua longa estadia em Bruxelas onde estudou Belas Artes. Ao longo do filme, Sines transpira a vida excêntrica e avant garde de Al Berto pouco tempo após a revolução dos cravos

“Eu conheci o Al Berto pessoalmente e cresci com ele porque somos ambos de Sines. Descrevo-o como uma personagem marginal, um homem fascinante, que sempre fez e disse sempre o que queria. O Al berto era uma pessoa maravilhosa e deliciosamente doido. Curiosamente a obra máxima chama-se “Medo” e eu nunca vi medo naquele homem. Existe uma identidade com a condição artística, a minha e a dele.”

Vicente Alves do Ó

 

 

 

Relação amorosa entre o poeta e o irmão do realizador, nos anos 70, cruza-se com a história de um grupo de jovens esclarecidos de Sines, deslumbrados com a liberdade.

O primeiro filme biográfico sobre Al Berto não conta a história de vida do poeta. Não por inteiro. A película realizada por Vicente Alves do Ó centra-se apenas no período de 1975 a 1978, depois de Al Berto regressar do exílio em Bruxelas e se instalar em Sines. Na vila da costa alentejana onde tinha crescido, vive naqueles anos uma relação amorosa que a comunidade censura. É este um dos temas principais do filme.

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Em vez de revisitar a narrativa do poeta maldito, apaixonado pela noite, imagem que Al Berto ajudou a construir através do que deixou escrito, o realizador escolheu uma fase solar da vida do poeta, cheia de sonhos e ambições, logo a seguir ao 25 de Abril de 1974, sob influência da cultura francófona, do rock inglês e americano e do espírito libertário que então se vivia.

O fim dos anos 70 é um período que pouca gente conhece, porque a imagem pública dele corresponde sobretudo à década de 80, quando se tornou célebre como escritor”, diz o realizador. “Entre 75 e 78, Al Berto estava a abandonar a pintura, que tinha estudado em Lisboa e Bruxelas, e começava a abraçar a literatura. Fascina-me perceber este tipo de motivações e escolhas dos artistas. O que ele viveu naqueles anos foi muito importante para o que viria a ser como escritor e pessoa, e revela um Al Berto muito mais solar do que se pensa.”

Vicente Alves do Ó tem 45 anos, nasceu em Sines e conheceu bem o autor de “Horto de Incêndio”. Como realizador, levou ao grande ecrã a vida da poetisa Florbela Espanca, em “Florbela” (2012), e como encenador recriou a história do cantor António Variações, na peça de teatro “Variações, de António” (2016).

O guião de “Al Berto” escreveu-o em 2014, mas decidiu há um ano, em agosto, testá-lo e alterá-lo. Mudou-se com o grupo de atores do filme para uma casa junto à Lagoa de Santo André, a poucos quilómetros de Sines, para um retiro de trabalho. Viveram por três semanas como uma família, faziam as camas, iam às compras, cozinhavam em conjunto. Este método de trabalho nunca tinha sido utilizado por Vicente Alves do Ó, mas ajudou a fortalecer a relação entre os membros da equipa, fazendo com que o filme ganhasse um tom realista no que respeita à amizade entre protagonistas. É por isso que o realizador utiliza a expressão “filme coral”.

Nessa fase, início dos anos 90, já Al Berto estava consagrado. Relacionava-se muito bem com o meio intelectual de Lisboa, dirigia o Centro Cultural Emmérico Nunes, em Sines, que ajudou a fundar, e levava à terra os nomes portugueses mais conhecidos das artes e letras. “Cresci com o Al Berto a convidar para o Centro Cultural todos os grandes nomes, Cabrita Reis, Rui Chafes, Ilda David, Nuno Artur Silva, tanta gente. Uma grande parte da minha formação artística foi feita desta forma. O Al Berto conhecia toda a gente”, recorda o realizador.

Quanto ao elenco do filme, é quase integralmente composto por atores jovens e pouco conhecidos. Destaca-se Ricardo Teixeira, de 25 anos, que faz de Al Berto. Foi escolhido por Vicente Alves do Ó por ter semelhanças físicas com o poeta, incluindo na voz.

Conheço tanta gente incrível dos teatros que precisa de uma oportunidade. Não queria miúdos viciados pelas televisões e novelas, queria frescura de quem ainda sonha com isto, e fui à procura”, conta o realizador. “Quando encontrei o Ricardo Teixeira, percebi que ele tem muita coisa do Al Berto e quando ouvi o tom de voz fiquei completamente convencido.”

A rodagem de “Al Berto” durou seis semanas, entre outubro e novembro do ano passado. Três semanas em Sintra, num local que se assemelha ao “palácio” em que o poeta viveu (hoje em ruínas, propriedade de uma instituição bancária), e três semanas em Sines. O financiamento foi assegurado pelo Instituto do Cinema e do Audiovisual, pela RTP e pela Câmara de Sines.

Bruno Horta, observador